CONEXÃO PESQUISOU: Brasil tem uma morte de LGBT a cada 28 horas.

Terminou de forma trágica a procura pelo corpo de Sheila Medeiros. Seu corpo foi encontrado na manhã de uma segunda-feira (29 de maio) em um terreno nas proximidades da Igreja Batista, na rua Potiguar de Carvalho Veiga, ao lado do número 373. A PM disse que o corpo de Sheila, cujo nome de batismo é Tedigrey Balbino Silva, não apresentava sinais de violência claros, embora estivesse seminu e somente a autopsia confirmaria qualquer violência ou abuso. O corpo foi localizado por um pedreiro que trabalha numa construção ao lado. O Conexão Três Pontas, sessenta dias depois do caso, voltou ao assunto e conseguiu informações novas e importantes.

A morte de Sheila Medeiros ainda continua causando comoção e perplexidade na população trespontana. Sheila desapareceu no sábado (27) a noite e seu corpo foi localizado seminu em um terreno baldio. As imagens das câmeras da igreja ajudaram a Polícia Civil a investigar o caso.

Novidades

De acordo com os investigadores da Polícia Civil que conversaram com nossa reportagem na última terça-feira, várias pessoas, principalmente amigos e aqueles que estiveram com Sheila nas últimas horas de vida, foram chamados, compareceram à Delegacia da Polícia Civil e prestaram depoimento.

E conforme esses investigadores o Laudo da Perícia de Varginha NÃO APRESENTOU QUALQUER SINAL DE VIOLÊNCIA contra Sheila Medeiros. “Esse laudo da perícia mostra na verdade o que é que aconteceu do corpo para fora, ou seja, no lado externo, aquilo que basicamente é visível. Apesar de algumas escoriações no joelho, não foram encontrados sinais de estrangulamento, lesões provocadas por arma de fogo ou objetos perfurocortantes.

Portanto, de acordo com esse laudo pericial não houve violência, não houve crime. Mas a questão ainda não está fechada porque ainda aguardamos a chegada do Laudo da Necropsia, que é feito em Belo Horizonte pelo Instituto Médico Legal e que demora bem mais para chegar.

Somente com o envio desse laudo necropsial é que cravaremos a causa da morte. Nosso trabalho está feito, ouvimos várias pessoas, investigamos o caso e agora nos resta a chegada desse último laudo, última peça do quebra-cabeça para fechar a questão”, explicaram dos PCs.   

Entenda o Caso

Sheila Medeiros foi encontrada na manhã da segunda-feira (29 de maio) em um terreno nas proximidades da Igreja Batista, na rua Potiguar de Carvalho Veiga, ao lado do número 373. Exames preliminares da perícia técnica não indicaram sinais visíveis de violência.

O corpo foi localizado por um homem que estava numa construção ao lado.

Informações da Polícia Militar

Nossa reportagem conversou com o Sargento Maxsuel, que estava de serviço na manhã do dia 29 de maio, quando o corpo de Sheila foi encontrado. Ele trouxe informações importantes ao Conexão:

“Nós recebemos na verdade uma ligação do proprietário de uma construção que fica ao lado do terreno onde  corpo de Sheila Medeiros foi encontrado. Ele relatou que estava mexendo no telhado da construção e que viu o corpo caído ao lado do muro que separa a construção do terreno. Desde então, por volta das 10 horas da manhã, da segunda-feira, suspeitou-se ser o de Sheila.

Então nós nos dirigimos para o local, isolamos a área e aguardamos a chegada da perícia técnica. Em conversa com a perita Letícia, nos foi dito que não havia sinais visíveis no corpo da vítima. Com relação a parte sexual não nos foi passado detalhes, embora alguns preservativos tenham sido encontrados ao lado do corpo, que estava seminu.

Pelo que apuramos, o local era usado por Sheila Medeiros para programas. Há imagens de câmeras da Igreja Batista e de casas vizinhas que ajudarão a Polícia Civil, que assume a investigação do caso”, explicou na época.

Câmeras

A Polícia Civil está de posse das imagens gravadas por câmeras em frente ao terreno baldio onde o corpo de Sheila foi encontrado. Nas imagens noturnas dá pra ver Sheila Medeiros chegando ao terreno, ela anda calmamente até o local, com seu telefone celular na mão. Pouco depois chega um homem.

Mortes LGBT

O Grupo Gay da Bahia (GGB), mais antiga ONG a militar pelos direitos dos homossexuais no Brasil, divulgou o Relatório de Assassinatos de Homossexuais. De acordo com a lista, 312 LGBTs foram assassinados no ano passado, o que significa uma morte a cada 28 horas. Os números representam um decréscimo de 7,7% na comparação com o ano anterior quando houve 338 mortes, mas um aumento de 14,7% na comparação com o ano anterior.

Os gays lideram os “homocídios”: 186 (59%), seguidos de 108 travestis e transexuais (35%), 14 lésbicas (4%), dois bissexuais (1%) e dois heterossexuais. O estudo destaca a inclusão nesta lista de 10 suicidas gays, como aconteceu com um gay de 16 anos, de São Luís, que se enforcou dentro do apartamento “por que seus pais não aceitavam sua condição homossexual”.

De acordo com o GGB, o Brasil continua o país com o maior número de assassinatos por motivação homofóbica no mundo. O levantamento informa que nos Estados Unidos foram registrados 16 assassinatos de travestis e transexuais em 2013, enquanto no Brasil, foram executadas 108. “O risco, portanto, de uma travesti ou transexual ser assassinado no Brasil é 1280 vezes maior do que nos EUA”, afirma o relatório.

Por estado

Segundo o estudo, Pernambuco segue “há décadas” como o estado onde mais LGBTs são assassinados, 34 vítimas, para uma população de nove milhões de habitantes, seguido por São Paulo, com 29 mortes para 43 milhões de habitantes. Assim, o risco de um gay pernambucano ser assassinado é quatro vezes superior aos LGBTs paulistas.
Roraima com 3 homicídios é o estado mais perigoso para homossexuais em termos relativos, com um índice de 6,15 assassinatos para cada milhão de habitantes, sendo que para toda a população brasileira, o índice é 1,55 vítimas LGBT por milhão de brasileiros. Mato Grosso ocupa o segundo lugar em periculosidade: seus 15 assassinatos representam 4,71 crimes por milhão, seguido do Rio Grande do Norte com 15 mortes, 4,45 por milhão de habitantes.

No outro extremo, os estados onde se registraram menos homicídios de LGBT foi o Acre – aparentemente nenhuma morte nos últimos três anos, seguido de Espirito Santo, cujas 2 ocorrências representam 0,52 mortes para cada milhão de habitantes, Pará com 0,63, São Paulo com 0,66, Rio Grande do Sul com 1,16, Minas Gerais com 1,21 e Rio de Janeiro com 1,22 mortes para cada milhão de habitantes.

Por idade e raça

Segundo o relatório, o maior número de assassinatos concentra-se entre LGBTs entre 20 a 40 anos (55%). O GGB destaca ainda que 7% dos homossexuais tinham menos de 18 anos, sendo o mais jovem uma travesti de apenas 13 anos morta em Macaíbas, Rio Grande do Norte.

Quanto à raça, o número aponta um número maior de vítimas entre pardos e pretos, 53% para 47% de brancos. Quando separados os dados de pardos e pretos, os últimos são o menor grupo vítima da homofobia letal, 3%, estando ausentes no segmento das lésbicas.

Brutalidade

Quanto à causa das mortes, 100 dos assassinatos foram praticados com arma branca (faca, punhal, canivete, foice, machado, tesoura), 93 com armas de fogo, 44 espancamentos (paulada, pedrada, marretada), 31 por asfixia, 4 foram queimados. Constam ainda afogamentos, atropelamentos, enforcamentos, degolamentos, empalamentos e violência sexual, tortura. Quinze das vítimas levaram mais de uma dezena de golpes ou projéteis.

O estudo do GGB exemplifica o quadro de brutalidade rememorando os casos de Emanuel Bernardo dos Santos, de Serra Redonda, PB, 65 anos, professor e ex-vereador, morreu com 106 facadas e com cabo de foice introduzido no ânus; Eliwellton da Silva Lessa, negro, 22 anos, de São Gonçalo, região metropolitana do Rio, após ter sido xingado de “viado”, o motorista passou três vezes com o carro sobre seu corpo; a travesti Thalia, 31 anos, de Guarulhos, SP, foi morta com 20 tesouradas e teve seu pênis cortado; o funcionário público Everaldo Gioli de Andrade, 37 anos, foi morto num terreno baldio em Cuiabá, seu carro queimado, “o corpo foi encontrado amarrado, com visíveis sinais de tortura, com queimaduras feitas com pontas de cigarro e com mais de 20 golpes de facas e buracos de balas pelo corpo”.

Para o presidente do GGB, Marcelo Cerqueira, “há quatro soluções emergenciais para a erradicação dos crimes homofóbicos: educação sexual para ensinar aos jovens e à população em geral a respeitar os direitos humanos dos homossexuais; aprovação de leis afirmativas que garantam a cidadania plena da população LGBT, equiparando a homofobia ao crime de racismo; exigir que a Polícia e Justiça investiguem e punam com toda severidade os crimes homo/transfóbicos e finalmente, que os próprios gays, lésbicas e trans evitem situações de risco, não levando desconhecidos para casa e acertando previamente todos os detalhes da relação. A certeza da impunidade e o estereótipo do gay como fraco, indefeso, estimulam a ação dos assassinos.”

O antropólogo Luiz Mott, fundador do GGB, responsabiliza o governo federal pela ausência de políticas públicas para os LGBTs. “99% destes homocídios contra LGBTs têm como agravante seja a homofobia individual, quando o assassino tem mal resolvida sua própria sexualidade e quer lavar com o sangue seu desejo reprimido; seja a homofobia cultural, que pratica bullying e expulsa as travestis para as margens da sociedade onde a violência é endêmica; seja a homofobia institucional, quando o Governo não garante a segurança dos espaços frequentados pela comunidade LGBT ou como fez a presidente Dilma, ao vetar o kit anti-homofobia, que deveria ter capacitado mais de 6 milhões de jovens no respeito aos direitos humanos dos homossexuais”.

12729255_119502638436882_132470154276352212_n

Roger Campos

Jornalista

(MTB 09816)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *