Como o saudoso Fernando Brant já dizia na célebre canção: … “todo artista tem de ir a onde o povo está”… Nós, cansados, subjugados e descontentes artistas, compositores e músicos, procuramos nosso trabalho e sustento em diversos e diferentes lugares, para mostrar o que sabemos realmente fazer que é música. Mas aí vem o choque de realidade, e com ele a pergunta: Onde estará esse povo? Em shows? Cada vez mais carentes de pessoas, quem dirá de platéia. Teatros? Rarissimamente e com público escasso. Nos bares? Igualmente esquecidos da boa boemia musical dos tempos de outrora.
A relação artista- público nunca esteve em vias tão distintas. “O que será, que será?” O que esse povo anda fazendo? Que não saindo de suas casas e permanecendo em suas “fortalezas” virtuais? Na falsa sensação existencial, que seus espíritos presos nem sequer presumem. “É a crise” dizem uns, “é o tempo frio” dizem outros, ou até pode-se ouvir o famoso ditado: “santo de casa não faz milagre”.
Outro dia ouvi músicos comentando que têm que parar com sua música a pedido do proprietário, ou muitas vezes dos próprios frequentadores das casas em que se apresentam, para exibição de lutas na TV. Como assim?! Tudo bem que nem todos os músicos são suficientemente bons ou agradáveis. Mas o que me deixa intrigado é o fato dessas pessoas saírem de suas casas, e se dirigirem para um lugar que sabem notoriamente que está havendo música ao vivo, para simplesmente assistirem aos shows de barbárie explícita na televisão( o que poderia ser assistido nos seus próprios e confortáveis lares, ou melhor ringues particulares).Para onde foi o respeito ao artista e antes de tudo pelo profissional que se apresenta ali?
A verdade é que a arte musical sempre esteve (com raras e notáveis exceções) na contramão dos povos e das grandes massas. Mas nunca, e tão ameaçadoramente como agora.
A meu ver esse vazio terá suas raízes naquilo que sempre foi discutido e dito como solução, não para esse único problema, mas para a maioria das máculas sociais e culturais desse nosso vasto país: a EDUCAÇÃO.
Não sei se é impressão, mas na nova propaganda midiática do governo federal, em que se utiliza um “funk”, com muitos jovens “cantando” e dançando, para convocar os alunos a retornarem as salas de aula, depois das curtas férias de julho, soa mais como um apelo suplicante, que contradiz aquilo que seu próprio sistema falho e em colapso já vinha causando há muito tempo, a apatia e a falta de interesse no conhecimento e na informação.
Com a cultura não poderia ser diferente. O vazio das casas noturnas, teatros, casas de espetáculo, escancara a alienação desse tempo e a indiferença a aquilo que seriam os últimos redutos da boa e velha música de sempre.
Você aí, que prefere ficar no” conforto” de seu computador micro ou macro, gastando seu precioso tempo de vida, e achando que vai encontrar tudo o que sonha e procura na tela e nos pixels que enxerga, sem perceber, deposita uma moeda no baú que isola, tranca e apaga toda uma história e evolução cultural conquistada (por pessoas reais e não “perfis” ou ”curtidas”) até o nosso presente. Eu mesmo, nesse exato momento em que escrevo, me utilizo desse meio que falo tanto (e não me abstenho também da culpa) para chegar até você, leitor.
Alguns vão dizer que isso será uma evolução natural causada pela modernidade. E o que ela traz consigo, será naturalmente entendido e compreendido no” futuro”.
Afinal, pra que sair de casa pra tomar uma cerveja, bater um bom papo com os amigos e ouvir boa música? Posso ter tudo isso aqui no conforto do meu celular, da minha poltrona. Talvez em um futuro não muito distante, as máquinas farão também o trabalho de músicos, artistas e até compositores. Aliás, pasmem, isso já esta seguindo lenta e veladamente seu caminho.
Então lhe pergunto caro leitor: Existirá um aplicativo para felicidade? Existirá um download para a emoção? Um link para o sentimento? Um reiniciador para a realidade? Uma formatação para a alma?
Pode até ser que um dia isso aconteça, mas receio, não terá metade da humanidade e do espírito, contidos em uma poesia declamada, em uma melodia bem tocada, em uma canção encantada e ao vivo.
O músico, assim como o artista, se nutre do calor das pessoas, do público, dos fãs, dos ouvintes. E esse alimento anda cada vez mais escasso. As pessoas distanciam-se cada vez mais de sua essência humana.
É gente fugindo de gente, pra se comunicar com seres e coisas ausentes. Será esse o futuro que nos espera? A irrealidade existencial? Isso com certeza vai trazer uma mudança radical em tudo e também na forma como artista e público se interagem. Se será benéfica ou não, a realidade que nos apresenta até o momento são casas de shows, teatros, centros de cultura e bares vazios de gente, de música, de arte, de vida. Por favor, o último a sair, apague a luz para a economia da máquina.