Pesquisadores brasileiros estão estudando a possibilidade de usar a vacina BCG, que serve para combater a tuberculose, contra a covid-19 – o que daria proteção contra as duas doenças ao mesmo tempo. Isso seria possível graças a modificações genéticas feitas na bactéria utilizada para fabricar a vacina.

“Existem outras iniciativas para usar a BCG no combate de outras doenças infecciosas e, com a pandemia, a gente pensou em usar contra a covid-19”, conta Sergio Costa Oliveira, coordenador da pesquisa e professor titular de imunologia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

A vacina ainda está na fase de produção em laboratório. “Estamos colocando os genes do coronavírus na bactéria usada na vacina BCG, para produzir o que se chama de ‘bactéria recombinante’, ou seja, geneticamente modificada”, explica o pesquisador.

De acordo com ele, a previsão é que os testes do imunizante em animais comecem até o final deste ano. Já os testes em humanos devem ter início no começo de 2021.

O projeto é feito em parceria com a UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), o Instituto Butantan, em São Paulo, e o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Doenças Tropicais (INCT-DT). Há ainda o apoio da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, e do Instituto Karolinska, na Suécia.

Como é feita a vacina

Oliveira explica que a vacina para tuberculose é fabricada a partir de uma bactéria capaz de infectar bovinos chamada Mycobacterium bovis. A versão usada na vacina é enfraquecida e recebe o nome de bacilo Calmette-Guérin, por isso a sigla BCG.

As mudanças genéticas feitas nessa versão mais fraca é que possibilitaria a dupla imunização contra a tuberculose e a covid-19. “A estratégia é fazer com que essa bactéria produza proteínas que estão presentes no coronavírus e são capazes de provocar uma resposta imune”, afirma o professor. “Seria um vetor para proteger contra a covid-19”, define.

Segura e capaz de ativar diferentes respostas imunes

Dentre as vantagens oferecidas por esta empreitada está o fato de que a BCG já é usada em vários países e, no Brasil, faz parte do Calendário Nacional de Vacinação do Ministério da Saúde, por isso a segurança de que ela não causa efeitos colaterais já está comprovada. “A gente espera que, com isso, o processo regulatório seja acelerado”, pontua.

Outro diferencial é que a vacina será capaz de ativar a imunidade inata – as primeiras armas do organismo, que servem para combater qualquer agente invasor – e a imunidade adaptativa – que vai fornecer uma resposta personalizada para o novo coronavírus.

“A bactéria BCG estimula o sistema imunológico de maneira inespecífica. Ela é usada, por exemplo, na imunoterapia contra o câncer de próstata”, cita Oliveira.

“A gente vai dar especificidade ao fazer com que ela produza proteínas [presentes no coronavírus]. Assim, ela vai estimular a fabricação de anticorpos neutralizantes e de linfócitos T [células de defesa que identificam e matam outras células infectadas]”, completa.

Produção em larga escala e parcerias

Uma estratégia para produzir o imunizante em larga escala ainda não foi pensada, mas a expectativa é que a parceria com o Instituto Butantan facilite esse processo. “A prioridade, neste momento, é fazer dar certo no laboratório e em animais”, destaca Oliveira,

Contudo, o objetivo não é substituir as vacinas produzidas em outros países que já estão em fases avançadas de testes em humanos.

“Cada vacina que está sendo testada tem suas peculiaridades e tecnologias. Pode ser que uma delas estimule uma parte do sistema imune e outra parte seja estimulada com uma vacina diferente. A gente não descarta que elas possam se complementar e ser eficazes”, pondera.

O projeto tem o apoio do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), mas ainda precisa de mais subsídios financeiros.

“São poucos recursos. A gente espera que na segunda fase de testes [quando eles avançam para humanos] seja possível atrair a parceria de empresas farmacêuticas”, afirma o coordenador.

Fonte R7

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Roger Campos

Jornalista

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