Considerações sobre esse importante meio típico de prova.

Ata notarial é um instrumento público através do qual o Tabelião narra objetivamente um fato, comprovando sua ocorrência, perpetuando-o no tempo.

Portanto, a partir do momento em que o Tabelião, através dos seus sentidos, atesta e descreve a existência ou modo de ser de um fato, surge ali um documento presumivelmente verdadeiro em decorrência da fé pública de que são dotados os Notários e Registradores.

Essa capacidade de apreensão do fato através dos sentidos não se restringe à visão. A descrição poderá se referir a cheiros e odores (olfato), eventual barulho ou som (audição), gosto (paladar) e textura ou formato (tato).

Portanto, um grande leque de opções se abre para o cidadão e para o operador do Direito. Saber que existe o mecanismo e que o seu uso não demanda tanta complexidade, poderá mudar o rumo de um processo judicial, administrativo ou até mesmo de uma discussão cotidiana. A ata notarial foi expressamente positivada no ordenamento jurídico no artigo 7º da Lei de Notários e Registradores, a Lei 8.935/1994. Com o advento do novo Código de Processo Civil, em 2015, passou a ser considerada meio típico de prova em seu artigo 384:

“A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião.

Parágrafo único. Dados representados por imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos poderão constar da ata notarial”.

A novidade, na ocasião da edição da lei, além da tipicidade da ata enquanto prova, está em seu parágrafo.

O Tabelião não precisa mais imprimir imagens e transcrever áudios, por exemplo, podendo se valer de arquivos eletrônicos, como um pen drive. Nada mais lógico e compatível com a realidade, bom que se diga.

ATRIBUTOS – POR QUE USAR A ATA NOTARIAL?

Porque a ata é um documento imparcial e presumivelmente verdadeiro.

Imparcial porque a lei e o regramento notarial assim determinam, sob pena de responsabilidade, e presumivelmente verdadeira porque o CPC, em seu artigo 405, não nos deixa duvidar da força probante que tem o instituto ao estabelecer que:

O documento público faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão, o chefe de secretaria, o tabelião ou o servidor declarar que ocorreram em sua presença.

Portanto, é desse modo – imparcial e verdadeira – que o destinatário da ata notarial, Judiciário ou não, deve considerar sua narrativa e observações.

APLICAÇÕES – EXEMPLOS PRÁTICOS

No Direito Imobiliário podemos pensar na certificação do estado do imóvel na entrega das chaves pela Construtora ou, ainda, quando do recebimento de um imóvel locado.

Um sujeito vai até o Tabelionato de Notas e solicita a lavratura de uma determinada ata para que seja documentada a situação de um imóvel que acabou de ser entregue pelo locatário.

Digamos que o imóvel foi devolvido com uma série de avarias que precisam ser reparadas imediatamente, porque o imóvel será locado por outra pessoa. O ex-locatário se nega a reparar os danos causados.

No dia e local acordados, o Tabelião, ou seu funcionário designado, vai até o imóvel, fotografa a cena e descreve objetivamente o que está vendo, sentindo.

Poderá constar na ata que as paredes estavam riscadas, danificadas, que determinados móveis estavam quebrados, que sentiu um odor forte na área de serviço etc. O vizinho ainda poderá ser ouvido e informar, por exemplo, que escutou determinado barulho e que viu determinada movimentação no dia da saída do inquilino.

Importante que o requerente, ou seu advogado constituído, acompanhem a lavratura do documento para que sejam observadas e apontadas na ata tudo o que consideram

importantes. Veja, não se trata de tornar o ato parcial, mas de chamar a atenção do Notário para fatos que poderiam passar eventualmente despercebidos.

Pronto. Prova formada, o locador poderá fazer os reparos devidos pleiteando a indenização em momento posterior.

Nesse sentido, uma infinidade de aplicações pode ser pensada.

Na área Previdenciária, a ata pode se prestar a atestar a limitação de locomoção de um segurado acamado ou o reconhecimento de união estável através da coleta de depoimento de vizinhos, conhecidos, conversas em aplicativos de celular.

Pode também ser útil para o empregador na desconstituição de fatos alegados pelo empregado através de postagens em redes sociais e pode ainda o empregado comprovar assédio por parte da empresa.

Outra importante aplicação é comprovar a assembleia de entidades, de condomínios edilícios, reunião de acionistas. Comprovar a realização de um sorteio.

A ata ganha efetividade ao preservar uma prova que possa desaparecer com o tempo!

Na área criminal, podemos pensar no depoimento de uma testemunha que poderá nunca mais ser encontrada, narrando o que foi visto para ser usado posteriormente.

Falando em desaparecimento de provas, o que dizer de postagens em redes sociais ou em sites? Literalmente podem desaparecer num piscar de olhos. Daí a relevância da confecção de uma ata notarial.

MAS E O “PRINT SCREEN”?

O “print” da postagem, da página de um site, do “story”, não teria o mesmo valor no processo? Em tese, não. O “print” é prova constituída unilateralmente e poderá ser contestada pela outra parte podendo o juízo desconsiderá-la por completo.

O mesmo não ocorre com a ata notarial, porque nesse caso, o Tabelião irá receber o link do solicitante e vai ele mesmo acessar o conteúdo objeto da narrativa, documentando todo o passo a passo.

Por óbvio que o direito pleiteado não será garantido única e exclusivamente pela ata notarial. Entretanto, o interessado tem a possibilidade de utilizar a seu favor uma prova robusta a um custo razoável a ser ponderado com o possível proveito obtido.

Por fim, mas não menos importante, não se pode esquecer da obrigatoriedade do uso da ata notarial para fins de usucapião extrajudicial. O legislador fez constar a ata como requisito para seu pleito (LRP – lei nº 6.015/79, artigo 216-A) dada a segurança e robustez que poderá conferir à caracterização da posse do bem a ser usucapido.

A regularização de imóveis através do processamento da usucapião nos cartórios foi um importante avanço legislativo. Conferiu eficácia ao comando constitucional de garantia do direito de propriedade e atendeu a necessidade premente de desafogar um pouco o Judiciário do país. Afinal, se litígio não há, por que impor o ônus do tempo ao sujeito?

Nesse sentido, a ata notarial é de suma importância para atestar o tempo de posse do requerente e de seus antecessores de modo a estabelecer a modalidade correta de usucapião.

E, ainda que não haja tempo suficiente para usucapir, a lavratura de atas notariais sucessivas, ao longo do tempo, certificando a posse do imóvel, nos parece uma excelente forma de garantir esse direito com mais tranquilidade lá na frente.

CONCLUSÃO

A ata notarial é um mecanismo interessantíssimo e de pouco uso ainda se considerarmos a abrangência de sua aplicação.

Isso pode estar associado tanto a falta de conhecimento quanto à sua existência ou às suas aplicabilidades e procedimentos, como ao seu alto custo em alguns Estados.

De todo modo, é importante tê-la em nosso radar quando avaliamos determinada situação. Não é incomum sentir as mãos atadas diante de um fato que pensamos não ter como comprovar, atestar, de maneira imparcial e com fé pública.

A ata pode robustecer um direito ou enfraquecê-lo. Sendo advogado ou não, agora você já sabe que o mecanismo existe e pode lhe ser extremamente útil.

Então por hoje é só pessoal, na próxima semana teremos um novo artigo.

Estejam todos com Jesus!!!

Gabriel Ferreira de Brito Júnior – OAB/MG 104.830

Trabalhou como Advogado na Sociedade de Advogados “Sério e Diniz Advogados Associados” por 13 anos, Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil pelo Centro Universitário Newton Paiva (2006), Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de Varginha – FADIVA (2001), Oficial de Apoio Judicial (Escrevente) do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais por 10 anos (1996-2006), Conciliador Orientador do Juizado Especial Itinerante do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (ano 2004).

Presidente da Comissão de Direito Civil e Processo Civil da 55ª Subseção da OAB da Cidade e Comarca de Três Pontas/MG

Atualmente cursando Especialização em “LEGAL TECH, DIREITO, INOVAÇÃO E STARTUPS” PELA PUC/MG.

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