Mais de 1 milhão de pessoas foram mortas no campo de concentração durante o regime nazista alemão.

Sobreviventes do regime nazista alemão voltaram nesta segunda-feira (27) ao campo de extermínio de Auschwitz-Birkenau, na Polônia, para a cerimônia que marca 75 anos da libertação pelas tropas soviéticas.

Em muitos casos, eles são acompanhados por filhos, netos e até bisnetos, de acordo com a agência de notícias Associated Press.

Com gorros e lenços listrados de azul e branco, simbolizando os uniformes dos prisioneiros no campo, os sobreviventes atravessaram, com tristeza, o célebre portal de ferro com a inscrição “Arbeit macht frei” (“O trabalho liberta”, em tradução livre do alemão para o português).

Acompanhados do presidente polonês, Andrzej Duda, eles depositaram coroas de flores perto do “muro da morte”. Mais de 1 milhão de pessoas foram vítimas nesse campo de concentração, que é considerado um dos principais símbolos do genocídio.

Eram esperados mais de 200 sobreviventes na cerimônia desta segunda-feira. Muitos deles são judeus vindos de vários países, como Israel, Estados Unidos, Austrália, Peru, Rússia, Eslovênia, entre outros.

Holocausto

Quando os nazistas chegaram ao poder na Alemanha, em 1933, iniciou-se uma perseguição aos judeus. Nessa primeira etapa da campanha para erradicar a população judaica na Europa, foram-lhes confiscados propriedades, direitos e liberdades.

Depois da invasão alemã à Polônia em 1939, os nazistas começaram a deportar judeus da Alemanha e da Áustria para o país, onde criaram guetos para separá-los do resto da população. Em maio de 1940, Auschwitz foi transformado em uma prisão para presos políticos.

Em 1941, durante a invasão alemã na União Soviética, os nazistas começaram de fato a campanha de extermínio.

Seis milhões de judeus foram mortos no Holocausto e Auschwitz está no centro do genocídio. Estima-se que, em menos de quatro anos, ao menos 1,1 milhão de pessoas foram mortas no campo de concentração polonês. Quase 1 milhão era judeu.

As vítimas levadas a campos de concentração eram mantidas em situação deplorável, trabalhavam até a morte ou eram levadas a câmaras de gás.

Em 27 de janeiro de 1945, tropas soviéticas entraram no campo de concentração e encontraram os sobreviventes magros, torturados e exaustos.

Apenas cerca de 7 mil prisioneiros esqueléticos e doentes terminais tinham sobrevivido, sendo que 500 deles eram crianças. Poucos conseguiam ficar de pé, muitos estavam deitados no chão, apáticos.

HÁ EXATOS 75 ANOS, O EXÉRCITO VERMELHO LIBERTAVA O CAMPO DE CONCENTRAÇÃO DE AUSCHWITZ

No final da guerra, prevendo a vitória dos aliados, os alemães começaram a destruir crematórios e documentos enquanto evacuavam os prisioneiros de Auschwitz. Os que não conseguiam andar foram deixados lá e liberados pelo Exército Vermelho em 27 de janeiro de 1945. Lá, cerca de 1,5 milhão de pessoas morreram, a maioria em câmaras de gás.

Arbeit machr frei (“O trabalho liberta”, em português). Era essa a inscrição na entrada do maior campo de concentração nazista. Erguido em 1940 nos subúrbios da cidade de Oswiecim, na Polônia, ele tinha três partes: Auschwitz I, a mais antiga; Auschwitz II-Birkenau, que reunia o aparato de extermínio; e Auschwitz III-Buna, com cerca de 40 subcampos de trabalho forçado.

As primeiras vítimas do nazismo foram poloneses, seguidos de soviéticos, ciganos e prisioneiros de guerra. Em 1942, o campo voltou-se para a destruição em massa dos judeus. Os presos eram obrigados a usar insígnias nos uniformes conforme a categoria – motivo político era um triângulo vermelho; homossexual, um rosa. Muitos foram usados em experimentos médicos.

Fornos de Hitler

Entre as muitas vítimas estava Olga Lengyel. Uma judia que vivia com o marido e os  filhos na cidade de Cluj, capital da Transilvânia. Ao ouvirem relatos sobre as atrocidades cometidas pelos nazistas em terras ocupadas, não acreditaram que isso poderia se tornar um pesadelo real.

Em 1944, o seu marido, que era médico, seria deportado para a Alemanha. Ela acreditava que o companheiro poderia ser enviado para suprir a falta de médicos, e assim optou por segui-lo com os filhos. Contudo, era uma emboscada. O destino final da família seria Auschwitz. No local, Olga perdeu a sua família. Entretanto, sobreviveu para contar a sua trajetória. Em Os Fornos de Hitler, Olga detalhou um dos primeiros relatos sobre o horror dos campos de extermínio nazistas.

“(…) Os alemães deixavam vivos alguns milhares de deportados de cada vez, mas apenas para facilitar o extermínio de milhões de outros. Faziam tais vítimas executar seu trabalho sujo. Elas faziam parte do sonderkommando. Trezentas ou quatrocentas serviam em cada forno do crematório. Seu dever consistia em empurrar os condenados para dentro das câmaras de gás e, depois que o assassinato em massa tivesse sido cometido, abrir as portas e transportar os cadáveres.”

Hoje, Auschwitz é um museu que preserva a memória do maior genocídio da História.

Conheça a dura rotina no campo de concentração

Seleção dos “capazes”

Os prisioneiros chegam em trens de gado e são selecionados por médicos. Os aptos ao trabalho entram numa fila e são tatuados com um número de registro. Velhos, doentes, grávidas, crianças e a maioria dos judeus vão para outra fila, direto para a câmara de gás. Os capazes tomam banho de desinfecção (contra tifo), raspam o cabelo e deixam seus pertences.

Trabalho escravo

Os presos trabalham pelo menos 11 horas por dia para impulsionar a máquina de guerra alemã. Constroem prédios do campo de concentração e estradas e produzem carvão, borracha sintética, produtos químicos, armas e combustíveis em indústrias como a Krupp e a IG Farben. Embora não haja números oficiais, vários morreram de cansaço durante as obras.

Pão e sopa no almoço

A cozinha do campo prepara rações de comida três vezes ao dia, que em geral incluem um pedaço de pão, café e sopa de batata. Quem faz pouco esforço físico recebe cerca de 1300 calorias diárias. Os que trabalham pesado ingerem 1700 calorias. Após algumas semanas, essa dieta de fome leva à exaustão, deterioração do corpo e até morte.

Entre ratos

Em Auschwitz I, cerca de 20 mil presos dormem em pavilhões de tijolo. Os treliches são em número insuficiente, e um preso dorme sobre o outro. Não há banheiro nem calefação – mesmo com temperaturas abaixo de zero. Em Birkenau, os alojamentos são blocos de madeira e tijolos feitos sobre o solo úmido. Cerca de 700 pessoas ocupam cada um.

Espera congelante

Durante as assembleias de contagem, os presos ficam horas no frio, muitas vezes sem seus uniformes (calça comprida, camisa listrada e boina), esperando os nazistas decidirem quem será mandado à câmara de gás. Intelectuais, políticos e outras pessoas consideradas perigosas são fuzilados no Muro da Morte, nos fundos do bloco 11, ou enforcadas.

Matemática sinistra

Em geral, o destino de 70% dos prisioneiros é a câmara de gás. A maior parte das vítimas é trancada nua em locais fechados – os nazistas diziam que elas iam tomar banho. Dentro deles, uma tubulação expele ácido cianídrico. A morte chega, no máximo, em 10 minutos. Os corpos são depois queimados num dos cinco crematórios – juntos, podem queimar 4765 corpos por dia.

‘Está vendo aquela fumaça? É sua família’: o relato do brasileiro que sobreviveu a Auschwitz

“Não é todo dia que coloco a tefilin em cima do número de Auschwitz”, diz o rabino David Weitman logo depois da breve cerimônia, em uma sinagoga na região central de São Paulo, em 11 de novembro de 2019. “E é a primeira vez que faço isso em alguém dessa idade. É muito emocionante. Os nazistas se foram, mas nós estamos aqui.”

O tefilin citado por Weitman são tiras de couro tradicionalmente colocadas no braço de meninos judeus que, ao completar 13 anos, realizam seu bar mitzvah — cerimônia judaica que é celebrada como um rito de passagem.

Naquele dia, porém, o bar mitzvah era para um senhor de 91 anos: Andor Stern, brasileiro de nascença que, aos 13 anos, estava escapando da perseguição na Hungria, terra natal de seus pais.

Andor Stern acabaria capturado e viveria cerca de um ano no campo de concentração em Auschwitz, na Polônia, o maior e mais cruel símbolo do Holocausto. Os números que o identificavam no campo continuam tatuados em seu braço: 83892. Ele é tido como o único brasileiro nato a sobreviver a Auschwitz.

Stern sobreviveu não apenas para ser homenageado, em novembro, pelo Memorial da Imigração e do Holocausto, com um bar mitzvah especial e tardio — mas também para reerguer sua vida no Brasil, criar uma família com cinco filhos (e muitos netos e bisnetos), perder tudo em uma das crises econômicas brasileiras na era Collor e manter-se ativo profissionalmente até agora. E fazer tudo isso com grande apreço pelos pequenos prazeres do cotidiano.

‘Minha família saía pela chaminé’

Filho de imigrantes judeus, Stern nasceu no bairro do Bixiga, em São Paulo, em 17 de junho de 1928. Mas viveu desde cedo uma vida itinerante. Aos três anos, mudou-se com para a Índia, por conta de uma oferta de emprego ao pai, médico. Depois disso — e Stern não sabe exatamente o motivo —, em vez de voltar ao Brasil, a família decidiu passar um tempo na Europa, com parentes húngaros.

Essa decisão selou seu destino de uma forma drástica.

Na Hungria, como brasileiro nato, Andor passou uma infância feliz e comum, embora fosse tratado como estrangeiro. As coisas mudaram quando a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) eclodiu. No momento em que o governo de Getúlio Vargas alinhou-se com os chamados países aliados (inimigos do Eixo, então liderado pela Alemanha e do qual a Hungria fazia parte), por ser brasileiro, Stern foi detido em uma instituição como inimigo estrangeiro pelas autoridades húngaras.

Foi uma estada breve: em poucas semanas, escapou com a ajuda de um detento americano de quem ficara amigo e, graças a isso, voltou à casa de sua família, onde passou a viver escondido. Ele tinha apenas 13 anos. Agora, o problema não era mais ele ser brasileiro: era ser judeu.

Com a posterior ocupação nazista da Hungria, sua família toda (menos o pai, que se separara da mãe e fora embora do país em 1938) foi transportada a Auschwitz em um mesmo trem, em 1944. Foram separados na chegada ao campo de concentração.

“Daí começou o calvário deles: meus avós, meus tios, minha tia grávida foram levados direto para a câmara de gás”, conta Stern.

A perda da mãe marcou Stern profundamente, e a tristeza superava as dores físicas do campo de concentração.

“Ela faz falta. Me lembro cada vestido dela. Incrível como tenho a cara dela na minha cabeça. Ela era minha maior amiga. Usei ela tão pouquinho”, diz à equipe da BBC.

Aos 14 anos, de porte atlético por conta de esportes como o remo e a natação, o adolescente foi poupado do extermínio na câmara de gás para ser usado no trabalho forçado no campo. O processo de desumanização também foi rápido.

“Uma mesma bacia de noite é penico e de dia é o prato em que você come. E você come como cachorro. Não tem garfo, faca, colher”, lembra.

“Você tem eczema, sarna. A comida te causa uma eterna diarreia, o que, aliás, é uma (das causas) que mais matavam as pessoas. No inverno, abaixo de 22, 24, 26 graus, quando você está ‘vazando’, você até gosta porque é quentinho. E você não tem como tomar banho depois disso. Você aceita a sujeira, a imundície. E você perde a condição de ser humano. Devora qualquer casquinha de batata. Só o que pensa é na fome. Você vira um zumbi.”

Quando o cerco internacional se fechava em Auschwitz, com notícias da aproximação de tropas russas, os alemães nazistas começaram a retirar a maior parte dos prisioneiros do local. Muitos foram enviados para as chamadas “Marchas da Morte” em que pessoas de todas as idades eram obrigadas a andar por quilômetros em meio ao rigoroso inverso. Milhares morreram a poucas semanas da derrota alemã na Segunda Guerra Mundial.

Stern foi um dos transportados, primeiro a Varsóvia (capital da Polônia, na época sob ocupação nazista), para recolher tijolos das ruínas dos bombardeios de guerra, e, depois, ao campo de concentração de Dachau, no sul da Alemanha, onde chegou a fazer trabalhos forçados para a indústria bélica alemã de aviões Messerschmitt e bombas V1.

Até que, no final de abril de 1945, o campo foi libertado pelo Exército dos EUA. Em 1º de maio, depois de quase um ano e meio sob poder dos nazistas, Stern estava livre.

“A guerra terminou e eu sobrevivi. Estava vivo. Pesava 28 quilos, mas estava vivo. (…) Perguntei a mim mesmo: ‘o que quero da vida? Onde estarei daqui a 5, 10, 20 anos?'”.

“Decidi o seguinte: ‘quero um par de sapatos em que não entre água e me aqueça no inverno; uma roupa isenta de qualquer bicho e que me cubra no inverno, um paletó com bolso e um relógio que eu possa olhar e dizer: ‘vou comer esse pão amanhã às 14h e vou resistir, porque não estarei passando fome’. Podendo me movimentar da esquerda para a direita, vou ser o homem mais feliz do mundo'”, conta.

“Isso passa, e você fica cheio de frescura”, brinca. “‘O sapato tem que ser de cromo alemão’, ‘O terno tem de ser de casimira inglesa’ [Mas] eu não esqueci. Tudo isso para mim era um presente extra. Cada dia que eu vivo é uma sobremesa. Talvez isso explique essa intensidade de querer viver e que os outros vivam. Tenho o máximo respeito pela vida.”

De volta à Hungria de seus parentes, Stern concluiu seus estudos e entrou em uma faculdade de engenharia, mas diz que começou a “sentir saudades do desconhecido”.

Era hora de voltar para sua terra natal: o Brasil.

Sem recordar-se de nenhuma palavra sequer de português, aos 20 anos de idade, Stern voltou à cidade onde nasceu e começou a erguer uma vida: reaprendeu a língua, teve um reencontro tardio com seu pai (que Stern achava que estava morto, mas formara nova família na Espanha), estudou engenharia e trabalhou na empresa de tecnologia IBM, experiência que o ajudou a abrir uma empresa própria.

Casado desde 1954 com Terezinha, Stern se diz afortunado por ter “filhos maravilhosos e uma mulher que é um ser humano invejável”. Não é um homem religioso. Acompanha política brasileira pelo noticiário e acha o presidente Jair Bolsonaro “um crápula” e “um bestalhão”, embora tampouco simpatize com o PT. Tem entre seus hobbies ler e escutar discos na vitrola.

Nesta semana, ele viajou a Auschwitz para os eventos em memória dos 75 anos de libertação do campo onde ficou detido.

Fonte R7 / G1 / History Channel / UOL

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Roger Campos

Jornalista

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